Crítica: A hierarquia desafiada de Que Horas Ela Volta?

O premiadíssimo filme de Anna Muylaert foi escolhido pela Ancine para representar o Brasil na disputa pela indicação ao Oscar do ano passado, Que Horas Ela Volta? conta a história da empregada doméstica Val, interpretada com esmero por Regina Casé. Imigrante pernambucana em São Paulo, Val veio em busca de trabalho e, todo mês, manda parte de seu salário para sustentar a filha Jéssica. Quando o filme se inicia, ela já trabalha na casa de uma família do Morumbi. Trata-se de Bárbara (Karine Teles), seu marido Carlos (Lourenço Mutarelli) e o filho adolescente Fabinho (Michel Joelsas), integrantes da classe média alta paulista.

O incidente catalizador da história é o anúncio de Jéssica (Camila Márdila), que comunica à sua mãe, por telefone, que está vindo para São Paulo para prestar o vestibular. Val não a vê há muitos anos e, quando pede permissão à patroa para que a filha se hospede na casa, ela lhe pergunta ‘quem é Jéssica?’. Ou seja, apesar de trabalhar e morar ali há mais de uma década, a patroa ainda não a conhece muito bem, certamente por falta de interesse. Esta é apenas uma das várias cenas contundentes que ajudam a pintar uma certa realidade sobre as relações entre classes no Brasil.

Quando Jéssica chega, depois de surpreender-se com a notícia de que a mãe mora na casa dos patrões, é introduzida ao núcleo familiar. A sua vinda produz um impacto bombástico, pois ela não parece ter aprendido as regras sociais que regem a vida de Val na residência. Quebrando leis tácitas, como ficar no quarto de hóspedes dos patrões, ela escandaliza sua mãe com a aparente falta de “inferioridade aprendida”: Jéssica não parece ter sido programada para enxergar-se como uma serviçal. Essa sua característica, descrita por Fabinho como uma ‘excessiva auto-confiança’, afetará a sua dinâmica com os moradores da residência.

A produção, bastante poética, contêm símbolos como a piscina e as xícaras pretas e brancas, que funcionam como metáforas visuais que complementam o filme. Além disso, as performances beiram a perfeição e, provavelmente, serão lembradas por anos a fio. No entanto, o melhor do filme é mesmo como é abordado o tema da mistura de classes e sobre os comportamentos, teoricamente, mal-vistos por elas. Ele parece nos questionar, entre outros, se essa inferioridade deveria ser realmente aprendida. Não seríamos todos iguais?
Por Jonah Tash – jonahtash@cine61.com.br – Twitter: @jonahtashcinema

Veja aqui o trailer do filme Que Horas Ela Volta?:

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