Animação Plantae retrata em detalhes a Floresta Amazônica

A animação Plantae, de Guilherme Gehr, integra a Mostra Competitiva da 20ª edição do Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (FICA), na Cidade de Goiás, em Goiás. O Cine61 – Cinema Fora do Comum conversou com o cineasta, que falou sobre seu mais recente trabalho. O curta animado demandou uma grande quantidade de processos e foi produzido em 14 meses.

Plantae toca em temas importantes, como o desmatamento da Floresta Amazônica, presente na figura do madeireiro. Existe algum tipo de “despertar” do madeireiro sobre o desmatamento? E como isso é abordado no curta?
Eu nasci em Joinville, Santa Catarina e, a partir dos quatro anos, fui criado no Paraná. E sempre tive apreço pela natureza da região. As montanhas, o mar, os rios. Mas em viagens, sempre notei que a maior parte dos trajetos, eu passava entre plantações, e não por florestas. Quando eu estava grande o bastante para compreender as coisas, sentia que não havia muita natureza remanescente por onde eu passava. Isso só se confirmou quando vi pela primeira vez uma fotografia de satélite do Sul do Brasil, onde era possível notar que o verde da região serrana era absolutamente mais intenso e escuro do que todas as demais áreas, e que o Parque das Aves, no Oeste do Paraná, única área “urbanizável” ainda preservada no Estado, é uma região minúscula diante da devastação que os humanos causaram com o seu progresso. O filme Plantae nasceu do sentimento de perda por esta região, mas se passa na emblemática região da Amazônia por uma questão prática. O madeireiro nesse caso, desperta como eu despertei, notando que a perda consequente é arrasadora. Para mim, ele passa por uma fugaz mas profunda experiência de compreensão que pode transformar sua vida. Assim, os fenômenos que se passam após o corte da árvore podem ser vistos como a marcha dessa compreensão.
O curta inicialmente ia trazer traços simples para animação, mas, posteriormente, surgiu a necessidade de representar a Floresta Amazônica com mais detalhes. Qual foi o motivo dessa mudança?
Quando escrevi as primeiras ideias que acabaram culminando em Plantae, eu pensava em um filme maior, com uma compilação de situações fantásticas onde a natureza revida de forma  surpreendente aos abusos que cometemos. Assim, pela dimensão que eu previa para o projeto, sendo um filme independente, eu só poderia fazer uso de uma técnica bem simples. O que eu imaginava nesse momento, era que o filme não teria cores, a imagem não teria qualquer traço de paralaxe sendo bastante bidimensional, e os movimentos de personagens seriam bastante restritos. A mudança veio quando eu optei por selecionar apenas uma das situações do roteiro original para ser um curta inteiro. A fim de mostrar o que posso fazer com as ferramentas que conheço, mostrar o estilo de animação e pintura que faço, resolvi enriquecer a estética para chegar a um nível que nunca havia chegado antes.
A animação do curta se baseou em vários processos, qual foi o maior desafio?
Pergunta difícil. Foram quatorze meses para produzir a parte visual do filme – desde os primeiros esboços até a geração do arquivo final. Como foram muitos processos, eu não sei dizer o que foi mais difícil. Prefiro mencionar que todos foram deliciosos e exigiram criatividade para buscar soluções. A título de exemplo, um momento difícil foi animar de trás para frente, no caso do último plano do filme, porque eu precisava de um início maior para algo que já tinha, então tive que desenhar um movimento reverso partindo da primeira pose que havia. Também foi curioso fazer as serragens de madeira que caem do corte da árvore. A solução bastante simples possibilitou que eu incluísse no filme a minha singela homenagem ao filme Fantasia, da Disney, que foi uma das animações que marcaram a minha infância. 
O curta captou sons de animais. Existiu alguma imersão da equipe na Floresta Amazônica? Como foi a experiência? 
Tanto eu quanto o Breno (desenhista de som), já havíamos passado por uma espécie de imersão antes da produção do filme. Ambos estivemos na Floresta Amazônica. Ele, inclusive, está lá novamente, gravando. Aprendemos com isso e incluímos no filme coisas que descobrimos também em pesquisas. Quando eu tinha cerca de três anos, junto com meu pai, irmão e mais algumas pessoas, fiquei perdido numa montanha no município de Garuva durante uma noite. Para me manter aquecido, meu pai me colocou para dormir em seu peito e todos queimaram suas meias. De quase nada lembro, claro, mas em certo momento houve uma quantidade tão inusitada de vaga-lumes que a imagem disso ficou gravada na minha cabeça até hoje. De fato, as sensações na mata, quando se perde o medo são incríveis. Se ouve muito mais, e nota-se que na mata, durante a noite, os insetos é que comandam o espetáculo.
Como você espera que o público do FICA vai receber Plantae? E os próximos projetos? Alguma nova animação?
Infelizmente não poderei acompanhar todo o festival, mas estarei presente nos últimos dias. O público do filme, em especial as crianças, têm demonstrado bastante curiosidade pelo filme. Isso me deixa muito feliz. Era isso o que eu queria, captar a imaginação e fazer com que as pessoas voltem sua atenção, mesmo que momentaneamente, para as consequências do nosso progresso. Creio que no FICA, o público já esteja afiado para esse exercício, e estou ansioso para ver isso. No momento estou sem tempo para me dedicar a novos projetos. Uma ideia que tenho e que precisarei de muita pesquisa e ajuda, é um filme aparentemente sem enredo, onde live action e animação se misturam para colocar em paralelo as diferentes fases da evolução biológica no planeta. Uma espécie de documentário lúdico sobre a força que eu chamo “de manutenção e transformação” que mantém ou muda os fenômenos da vida.

*Por Vinícius Remer da Silva – Especial para o Cine61 – contato@cine61.com.br


O jornalista viajou a convite da produção do FICA

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